quarta-feira, 15 de março de 2017

15 de março de 2017 - cada um luta com as armas que tem

Ontem eu tomei uma decisão difícil. Decidi aderir a paralisação de hoje. Por que difícil? Porque quem me conhece sabe que não combina muito comigo a adesão a greves e paralisações. No entanto, protestar contra a Proposta de Reforma da Previdência do Governo Michel Temer, me parece mais do que justo, por várias razões. 

Antes de esclarecer as razões pelas quais considero o protesto/manifestação justos, gostaria de dizer que não sou contra uma Reforma na Previdência, mas sim contra ESSA PROPOSTA do Governo. Gostaria também de registar a dificuldade que qualquer cidadão encontra quando busca por informações sobre o funcionamento do regime de aposentadoria dos nossos ilustríssimos políticos. Também falta transparência sobre os valores arrecadados pelo Sistema de Seguridade Social, na mesma proporção em que falta clareza sobre os conceitos de Seguridade Social e Previdência

Mas vamos às razões para parar no dia de hoje:

- idade mínima de 65 anos para aposentadoria - homens e mulheres, trabalhadores urbanos e rurais; 
- 49 anos de contribuição para ter direito a aposentadoria integral;
- redução das pensões por morte;
- regras de transição mal elaboradas; 
- a não inclusão de militares na Proposta de Reforma;
- fim de aposentadoria especial para professores;
- falta de clareza sobre como essa proposta irá acabar com os gritantes privilégios de políticos e servidores do alto escalão (principalmente do Judiciário);
- DRU (Desvinculação de Receita da União) de 20% dos fundos da Seguridade Social (para pagamento de juros da dívida?);

A elas se somam a situação vergonhosa de privilégios dos ex-presidentes da República (Sarney, Color, FHC, Lula e Dilma) que hoje consomem cerca de 5 milhões anuais dos cofres públicos, entre simbólicas aposentadorias, carros e funcionários a que têm direito e também as regalias inaceitáveis a que fazem jus ex-governadores, ex-deputados, ex-senadores...(ver aqui, aqui aqui).

Mas vamos ao que interessa. O Governo, a fim de justificar a necessidade e a urgência dessa Reforma, afirma que:
i) a população brasileira está envelhecendo e também vivendo mais;
ii) há um rombo na Previdência, ou seja, gasta-se mais do que se arrecada. 

O primeiro ponto também é apresentado por especialistas que são contra essa proposta de reforma. Segundo eles, em 20 ou 30 anos teremos, de fato, um problema na Previdência e, portanto, precisamos repensar alguns pontos do sistema previdenciário. No entanto, isso não seria justificativa para uma mudança drástica e imediata, como o Governo propõe nesse momento. Ver mais informações aqui, aqui e aqui

Quanto ao segundo ponto, há quem questione o Governo e afirme que não há rombo, como é o caso da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, como você pode ver aqui, aqui e aqui. Mas há quem faça uma ponderação, e peça mais cautela a esse respeito, como você pode conferir aqui, no texto de Marcos Aguiar Villas Boas. Como o Governo não é muito transparente com os números referentes ao fundo de previdência e da seguridade social, me parece ser, no mínimo, questionável o discurso oficial de colapso da Previdência. Por outro lado, não me parece possível assumir com 100% de certeza o discurso da ANFIP. O certo seria cobrarmos um detalhamento maior das contas da Seguridade Social. Quanto de fato se arrecada por ano? Quanto se deixa de arrecadar por causa de isenções? Essas isenções trazem contrapartida que favorecem os cidadãos? Se há um déficit, por que retirar dinheiro da Seguridade Social via DRU? Quanto, de fato, se retira do fundo de Seguridade via DRU? E para onde vai esse dinheiro? 

Sem dar ouvidos aos questionamentos que são feitos e classificando-os como calúnias ou farsas, o Governo e o PMDB têm feito praticamente um terrorismo midiático a fim de amedrontar a população, como se pode ver aqui,  aqui e aqui. O recado está dado: ou a Reforma da Previdência é aprovada, ou vamos cortar benefícios dos cidadãos. Mas se tratando dessa reforma, seria melhor dizer: ou cortamos direitos dos cidadãos ou cortamos direitos dos cidadãos...

Talvez seja importante registar aqui que o senhor Michel Temer, o mesmo que apresentou a PEC 287 ao Congresso Nacional, se aposentou aos 55 anos e recebe cerca de 30 mil reais brutos mensais (o que pode ser conferido aqui ou aqui). E não adianta o senhor presidente se justificar dizendo que quando se aposentou estava apenas seguindo as regras vigentes. Ninguém o acusa de ato ilegal. Mas é preciso apontar para a imoralidade desse senhor que, recebendo aposentadoria escandalosamente superior ao que ganhará a maioria dos cidadãos, agora vem dizer que os cidadãos devem trabalhar até os 65 anos para se aposentar e que se quiserem salário integral, terão que ter 49 anos de contribuição com a Previdência. Também nem adianta o Governo dizer que quem está reclamando da Reforma é quem ganha mais. Ao tranquilizar o povo, Temer nos recorda que cerca de 63% dos aposentados hoje, fazem jus ao salário integral, afinal, eles recebem salário mínimo, e com a Reforma isso não mudará, ou seja, continuarão recebendo salário integral, se tiverem contribuído por 25 anos e tiverem 65 anos... Claro, os que estão reclamando são aqueles que ganham mais do que o salário mínimo, e que para ter direito a se aposentar com o teto do INSS, cerca de 5.500,00, terão que ter 49 anos de contribuição. Esse povo está reclamando de barriga cheia... Aprenderam com os professores. Esses têm tantos privilégios e agora reclamam por ter que se aposentar com 65 anos. (Queria só ver quanto tempo o senhor Michel Temer iria aguentar, dando aulas em salas com 40 alunos...) Temer tem toda razão se ao dizer que quem está reclamando são os que ganham mais estiver se referindo aos seus amigos do Judiciário (promotores, juízes e desembargadores) cujas aposentadorias podem chegar a 100 mil reais. Mas não estou certa de que era deles que o presidente falava...

Mas tem muitas coisas sobre as quais o Governo não quer falar. Por exemplo, se há mesmo um rombo na Previdência, ao que tudo indica ele não é causado pelos aposentados que recebem salário mínimo (63% dos aposentados, segundo o Temer), mas sim pelas aposentadorias e pensões de militares, políticos e servidores públicos, principalmente os do alto escalão. Os funcionários públicos já estão reclamando faz um tempinho, pois depois da instituição do Funpresp, os pobrezinhos terão que sobreviver agora com o teto do INSS...E o que dizer dos militares, que ficaram de fora da Reforma? Quanto aos políticos, pelo §13 do artigo 40 da Proposta, eles são incluídos no Regime Geral da Previdência Social, mas haverá legislação própria para regular essas aposentadorias. Ou seja, nada nos garante que os privilégios cessarão... 

Uma Reforma da Previdência, assim como outras Reformas que prometem impactos direto na vida das pessoas (Reforma do Ensino Médio, Reforma trabalhista e sei lá mais quantas esse governo reformista pretende ainda apresentar), não pode ser feita a toque de caixa como o Governo Michel Temer tem feito. E que não me venham com o mantra do Marcelo Caetano (Secretário Nacional da Previdência Social) de que são ações de um estadista... Estamos presenciando o desmonte de uma série de serviços e direitos que a Constituição de 88 guardava. Digo guardava, porque os ataques à Constituição estão cada vez mais descarados. Essa Constituição tão elogiada e chamada de Constituição Cidadã, não agrada aos homens engravatados desse país. Só para não esquecer uma figuraça do Governo tucano paulista, que tão bem representa os homens engravatados desse país, o senhor secretário de educação Renato Nalini, quando o povo clama por direitos, na verdade está expressando "desejos, anseios, vontades mimadas e até utopias" (aqui). Afinal, o que sabe o povo sobre direitos? Justo é juiz ter auxílio moradia de 4 mil reais; desembargador ter aposentadoria na casa dos 100 mil reais. Quem melhor do que eles para saber o que é justo e o que são direitos? E se esses são os guardiões da Constituição, acho que já percebemos que não podemos contar com eles... 

Infelizmente não tenho a solução para esse problema. Mas acredito que seja qual for a solução, ela não pode penalizar as pessoas mais pobres, não pode castigar os trabalhadores que, ao longo de suas vidas, já são sacrificados com um salário de miséria. Não pode fechar os olhos para as injustiças sofridas pelas mulheres num mercado de trabalho machista, numa realidade que as faz trabalhar 7,5 horas semanais a mais do que os homens. Para ser justa, é preciso acabar com as distorções que existem hoje no regime previdenciário e deve levar em consideração as diferentes realidades dos trabalhadores (urbano x rural, por exemplo.). Além disso, é preciso repensar algumas práticas como é o caso da DRU. Quando se questiona essa desvinculação de receitas, ninguém está dizendo que é algo ilegal, infelizmente o Congresso aprovou, o que a torna constitucional. Mas cabe perguntar se essa prática é moralmente aceitável. 

Que fique registrado que eu acredito que é preciso fazer uma Reforma da Previdência, pois é urgente e necessário acabar com a farra que se faz às custas do cidadão/contribuinte. Precisamos nos unir e ficar atentos a tudo que os homens do poder estão fazendo. Precisamos nos informar e formar opiniões sólidas. Precisamos ser mais espertos do que nos creem, para não engolir discursos vazios de pessoas que escondem seus reais interesses sob urros de ódio e ignorância. O fato de alguns políticos serem contra a Reforma da Previdência levanta algumas suspeitas e pode ser sinal de que haja algo nessa Proposta que desabone a classe política, além do fato, é claro, de querem fazer média com o eleitor. No caso da família Bolsonaro, que vive às custas dos cofres públicos desde final da década de 80 (além do próprio, que é deputado desde 1991 e foi vereador do RJ de 1989 a 1991, os três filhos têm cargos no legislativo e sua ex-mulher também foi vereadora de 1992 a 1996 no Rio), seria de bom tom duvidar de suas razões para se posicionarem contra tal reforma. Nesse sentido, a entrevista de Jair para Folha de S.Paulo foi esclarecedora:
"Folha: Por que é contra a reforma da Previdência?
JB: Completamente contra. É um remendo de aço numa calça podre. Está muito forte a proposta dele. 
Folha: É a favor da exclusão dos militares da reforma? 
JB: A carreira militar tem tanto privilégio que nenhum deputado tem filho militar. 
Folha: O senhor tem três filhos no Legislativo.
JB: Não tem nada a ver. Eles viram que o pai sofreu, trabalhava 80 horas por semana [no Exército], com salário lá embaixo. Não queriam essa vida". 
Ou seja, os filhos do Jair entenderam que a vida de militar não vale a pena, já a de político... Mas vamos deixar os Bolsonaros para outro texto...


Embora também tenha participado do Ato dos professores (e que contou com presença de estudantes e outras categorias de trabalhadores) que ocorreu pela manhã em Campinas, o meu propósito do dia era contribuir com as mobilizações em torno desse tema da maneira que me sinto mais capaz - escrevendo. Certamente esse é um dos textos mais truncados que já escrevi, com uma quantidade assustadora de links. Mas estou tetando reunir no mesmo lugar a maior quantidade possível de material que possa nos auxiliar a pensar essa Reforma e esse momento que vivemos. Falta informação e sobra gritos desvairados e apaixonados de todos os lados. É preciso vencer a irracionalidade e uma arma eficiente nessa batalha é o conhecimento. 

*****

O que é Previdência Social? Mais informação aqui.
O que é Regime Geral da Previdência? Aqui;

Para quem ainda tem dúvidas sobre como ficarão as regras para aposentadoria se essa proposta for aprovada, aqui um link bem didático com o prof. Daniel Pulino, especialista em previdência pela PUC. 

Em tempo: segue abaixo outros links que podem ser úteis para discutir o tema:

link 1
link 2
link 3

Um comentário:

Rodolfo Medina disse...

Excelente! Gratidão pela partilha!
Continue firme nas lutas, à vitória sempre!

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